Estimulando o desenvolvimento neurológico do lactente
Noções de histologia e fisiologia cerebral

    Uma das maiores revoluções na abordagem da questão pedagógica foi a descoberta e a compreensão de como se faz a estruturação cerebral durante a infância. A Histologia (ciência que analisa a estrutura morfológica e o relacionamento celular) e a Fisiologia (ciência que estuda as funções celulares) têm fornecido elementos essenciais para a compreensão dos processos intelectuais como um todo, justificando e propondo novas técnicas pedagógicas.

    A partir da concepção, o organismo humano inicia a prodigiosa evolução que transforma dois gametas em um organismo adulto complexo e diferenciado. Dentro do processo, a formação, a estruturação, a maturação e o desenvolvimento do sistema nervoso e de suas funções ocupam lugar privilegiado, em razão da sua complexidade e peculiar cronologia. Ao contrário da maioria dos órgãos, que pouca ou nenhuma influência recebem do ambiente externo (uma vez que a sua arquitetura celular básica foi terminada em etapas intra-uterinas), o sistema nervoso continua a sua evolução após o nascimento, recebendo influências do meio e estruturando a sua arquitetura celular em função dessas influências.

    Basicamente, o cérebro é um órgão formado por dois grupos de células: as células gliais, que fornecem o arcabouço de sustentação, nutrição e metabolismo do órgão como um todo, e os neurônios ou células nervosas, responsáveis pela transmissão e processamento das informações codificadas através de impulsos elétricos.

    Tanto os neurônios como as células gliais provêm de uma mesma origem celular denominada camada germinal. Durante a gestação, podemos distinguir dois períodos de proliferação celular. A primeira fase, que acontece entre o segundo e o quarto mês de gestação, corresponde ao período de proliferação neuronial máxima. No sexto mês de gestação, o cérebro já possui quase todos os seus neurônios. A segunda fase, que se inicia no quinto mês de gestação e se prolonga até o primeiro ano de vida, corresponde ao período de proliferação glial máxima.

    Entre o terceiro e o quinto mês de gestação, ocorre a migração neuronial. Guiados pelos prolongamentos das células gliais, os neurônios migram pelas diversas camadas do córtex cerebral, estruturando a sua arquitetura definitiva.

    A partir do sexto mês de vida intra-uterina e estendendo-se por diversos anos após o nascimento, ocorrerá lenta e complexa seqüência de eventos, conhecida como organização celular cerebral. O processo de organização das células cerebrais inicia-se com o agrupamento de determinados neurônios, pela disposição em camadas de outros, pela diferenciação funcional e morfológica dos neurônios imaturos, pela elaboração de prolongamentos neuroniais (os dendritos, que recebem as informações codificadas, e os axônios, que as transmitem para outras células), pelo alinhamento dos prolongamentos neuroniais, pelo estabelecimento de contatos sinápticos entre os diversos neurônios, pela estabilização seletiva dos contatos sinápticos (as sinapses em excesso que não tenham uso ou função definida são eliminadas) e, finalmente, pela mielinização, que é o envolvimento dos axônios por uma bainha de mielina que lhes permite aumentar consideravelmente a velocidade de condução do impulso elétrico nervoso.

    A organização celular cerebral é processo estritamente dependente da interação com o meio ambiente. Todas as informações recebidas pelo sistema nervoso central através dos órgãos sensoriais serão processadas, armazenadas, interrelacionadas e contribuirão, de uma forma ou de outra, para a estabilização das sinapses, moldando e esculpindo os detalhes da arquitetura neuronial em formação.

    A maior parte do processo realiza-se precocemente, durante os primeiros anos. A superfície cerebral do recém-nascido tem cerca de 680 cm2. No segundo ano de vida, terá atingido a extensão do cérebro adulto, que corresponde a 1600 cm2. O peso do cérebro infantil praticamente dobra nos primeiros nove meses de vida, para atingir noventa por cento do peso do cérebro adulto aos seis anos de idade. Aos quatro anos de vida, a criança já terá mielinizado quase totalmente o seu sistema nervoso.

    Os estudos do desenvolvimento histofisiológico do sistema nervoso levaram à derrubada de alguns conceitos pedagógicos arcaicos, como o da maturação espontânea. O grande objetivo da escola formal é a alfabetização. Acredita ela que a criança deve ter uma certa maturidade neurológica para entrar na escola e poder receber aulas lógico-formais e ser alfabetizada. Crianças menores de sete anos não são admitidas para o aprendizado. Após o ingresso na escola, observa-se que algumas crianças progridem nos estudos, enquanto outras não conseguem aprender nada.

    O fato é que, após os sete anos de idade, a arquitetura neurológica está completamente definida. Crianças que têm a sorte de ser adequadamente estimuladas em seus lares têm maiores chances de sucesso escolar, enquanto as crianças que têm uma fase pré-escolar pobre, em termos de estímulos sensório-cognitivos, têm poucas chances de prosseguir na aventura intelectual. As crianças começam a ser admitidas cada vez mais cedo nas escolas e, pouco a pouco, novas técnicas pedagógicas com objetivos definidos começam a ser estabelecidas.

    Neste caminho, pudemos presenciar alguns absurdos. No afã de aproveitar ao máximo a fase de intensa proliferação neuronial, alguns pesquisadores começaram a queimar etapas do desenvolvimento, a alfabetizar bebês e a lhes dar treinamento matemático e enciclopédico. A maioria das técnicas tem objetivos pouco consistentes e dificilmente se consegue reproduzir os resultados dos autores. Apesar disso, muitas lições puderam ser tiradas das experiências. As duas principais são: os bebês têm capacidade de aprendizado muito maior do que se supunha e o desenvolvimento neurológico tem seqüência lógica que não deve ser desprezada em função de determinadas metas. É preciso conhecer o tipo de estímulo importante para cada fase do desenvolvimento e ter-se objetivos bem claros em mente.

    O aprendizado, que antes se iniciava nas classes pré-escolares, ganhou uma preparação no jardim da infância, que agora é antecedida pela pedagogia do maternal. O meu objetivo aqui é de estruturar um corpo de conhecimentos, para que vocês, mamãe e papai, possam, ainda dentro de casa, aprender a conhecer o bebê e suas necessidades de estímulo, atenção e afeto. A intenção é aproveitar ao máximo todo o potencial de desenvolvimento da infância.