Estimulando o desenvolvimento neurológico do lactente
O conceito de corporeidade

      Corporeidade é a maneira pela qual o cérebro reconhece e utiliza o corpo como instrumento relacional com o mundo.

    O corpo é movido por intenções provenientes da mente. As intenções manifestam-se através do corpo, que interage com o mundo, que dá uma resposta para o corpo, que informa a mente através de seus órgãos sensoriais, que, analisando as respostas obtidas do ambiente, muda ou reafirma suas intenções, utilizando o corpo para novas manifestações.

    A esta capacidade de o indivíduo sentir e utilizar o corpo como ferramenta de manifestação e interação com o mundo chamamos de corporeidade.

    A corporeidade do indivíduo evolui com a idade. É lógico que a corporeidade do recém-nascido é totalmente diferente daquela da criança de dez anos, do adulto ou do velho de oitenta anos; a do homem é diferente da da mulher; como a do indivíduo doente o é da que possui quando sadio.

    Durante a evolução da criança, a qualidade da corporeidade é um dos principais determinantes da estruturação neuropsicomotora. Por outro lado, a estruturação corporal na mente da criança é fundamental para o desenvolvimento do próprio corpo como organismo físico. Crianças privadas de adequado relacionamento corporal com o mundo tendem a ter desenvolvimento físico atrasado em relação às demais (o que chamamos em clínica de nanismo psico-afetivo).

    A qualidade da corporeidade depende, como em todas as funções neurológicas, da qualidade e desenvolvimento das relações neuroniais estabelecidas entre as áreas sensoriais e motoras do cérebro. Estas relações, a maioria estabelecida durante a primeira infância, desenvolvem-se através do treinamento corporal. Para ilustrar a que ponto o ser humano pode desenvolver a corporeidade, basta observar um grande dançarino de balé, um ginasta olímpico ou um campeão de judô. Nem é preciso dizer que, quanto mais cedo na vida do indivíduo as atividades forem treinadas, melhor será a performance. Mais adiante, demonstrarei algumas técnicas simples para o desenvolvimento dos diversos aspectos da corporeidade, em cada período da primeira infância.

ESTIMULANDO O DESENVOLVER DA CORPOREIDADE

    O vivenciar do mundo pelo corpo é um processo natural que, apesar de seguir padrões mais ou menos comuns a todos os seres humanos, pode ter grandes diferenças em termos de qualidade e intensidade, dependendo do tipo de atividades adotadas.

    A corporeidade do bebê também depende muito do padrão de atividades que seus pais estimulem ou permitam. O bebê que permanece no berço deitado o dia inteiro ou vive preso em cercados tem possibilidades mais limitadas de desenvolvimento do que o bebê adequadamente estimulado. É importante ter-se em mente, também, que o aspecto corporal contribui em muito para a estruturação da inteligência como um todo, inclusive quanto aos processos verbais.

    O estímulo do desenvolvimento da corporeidade do bebê é realizado com algumas técnicas simples, desde que envolvam tanto o aspecto sensorial quanto o motor.

    A interação do bebê com os pais, através de brincadeiras, afagos, carícias, massagens, cócegas, risos, é o primeiro passo neste sentido.

    Acostumar a criança a passear no colo (apesar do trabalho que isto possa representar) é fundamental para o desenvolvimento do processo corporal. Não só passear no colo, mas passear em diversas posições, principalmente com as costas voltadas para quem a carregue, de modo que possa ver as coisas ao redor. Bebês a partir de um mês de idade podem usufruir de técnicas como a de "voar", que consiste em apoiar o tronco da criança com uma mão e as pernas com a outra, levando a criança a explorar os detalhes da casa, frontalmente e com as mãos livres. Durante a exploração, a criança é elevada e abaixada várias vezes, devagar, estabelecendo noções de tridimensionalidade.

    Um lençol também pode ser de grande ajuda no desenvolvimento dos aspectos motores. Dobrado em uma faixa e colocado sob o tronco do bebê de três ou quatro meses que esteja no chão "de quatro", ou seja, apoiado nas mãos e nos joelhos, pode fornecer a sustentação necessária para que a criança tente seus primeiros deslocamentos engatinhando. Se este mesmo lençol dobrado em uma faixa for colocado envolvendo o tórax, logo abaixo das axilas e seguro nas extremidades perto das costas da criança, serve como sustentação para que o bebê de três ou quatro meses troque seus primeiros passos andando.

    A piscina também é uma grande ferramenta no desenvolvimento da corporeidade. Por mudar completamente o referencial de espaço contribui como estímulo para as áreas cerebrais responsáveis pela coordenação motora e o equilíbrio. Além disso, propicia sensações cutâneas diferentes, incentiva novas formas de motricidade e é uma diversão de primeira linha, promovendo interação de muito prazer com os pais.